Dentre todas as doses que cabem dentro da idéia e todas as luzes epiléticas piscando, nunca que ele esperaria encontrar um diabo tão bonzinho naquele inferno. Música alta (e ruim), festa estranha com gente esquisita, e no auge das pernas trocadas ele tropeça nela, entediada, sóbria, e rindo da cara dele, com um sorriso meio safado e de garotinha.
- Desculpa, moça.
- Vem cá.
- Onde?
- Vem cá, porra!
Enquanto o leva pela mão andando na frente e dançando, seu coração de pão doce se derrete, até chegar em um banco na área de fumantes.
- Cê fuma?
- Não.
- Então o que?
- Então senta aí, que cê não tá legal!
- Ih, te falar que tá é mó legal!
- An?
Muito mais pra lá do que pra cá, ele procura o maço de cigarros, faz a cara de galã mais meia boca do mundo, acende um Marlboro e com a voz sexy mais não sexy que poderia ser, fala:
- Eu fumo.
- Azar o seu!
E num puxão de Capitão Gancho mais rápido que a velocidade da luz, um beijo lento e cheio de uma sensação diferente que o coração de pão doce não está acostumado a sentir.
- Eca, beijo de cigarro!
- Eca, beijo de jacaré!
- Jacaré?
- 30 mordidas!
- Foi ruim?
- Foi ótimo.
Sorriso tão inocente, uns olhão verde cheio de vontade, e o resto da noite é história. Acorda em Laranjeiras, tendo que sair de fininho correndo o risco de acordar gente que não se tem a menor idéia de quem é, e vai sozinho tomar um café na padaria rindo da própria cara, assim como ela fez. Sem entender as coisas e sem querer entender, ele conheceu uma pessoa de verdade com uma identidade falsa. Um cigarro de bom dia, e na cabeça, um pensamento: "Essa porra é crime!"
Um dia o coração de pão doce termina por aí cheio de formigas.
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