quarta-feira, 27 de março de 2019

Inferno Astral pt. III - Éter

   Dentro da ampulheta me via, grãozinho de areia esperando minha vez de ser engolido pelo tempo. Os ponteiros andavam em círculos e eu também. Tateando no escuro, não encontrava o caminho de volta pra casa. Até desistir de voltar pra casa.
   Pulei do barco, homem ao mar. Nadei contra a corrente, deixei de ser coerente, me afoguei mil vezes aprendendo a nadar. Morri na praia em várias praias. E em varias praias, renasci.
   Abracei meus encostos um por um, agradeci, pedi perdão e continuei andando. Encontrei a agulha no meio do palheiro e espetei na jugular. Pela primeira vez me senti mortal. E milhões de vezes depois dessa. Acabaram as 7 vidas desse gato vira-lata.
   Comecei a cuidar do que resta a quatro mãos, e pela última vez, renasci. De tantos finais, o derradeiro recomeço. O melhor de todos. Voltei como jardineiro plantando sementes e colhendo frutos agridoces.
   Enquanto as novas sementes germinam, o mundo acaba, e ao mesmo tempo acaba de começar. Enquanto meu café esfria, o verme passeia pela lua cheia. E muita coisa acontece. Esqueço de pagar conta mas nunca esqueço de olhar pro céu.




Inferno Astral pt. I - Purgatório

Inferno Astral pt. II - Redenção