quarta-feira, 25 de janeiro de 2017

Rastro de luz

Já não era mais uma menina. Mas também ainda não era uma mulher. Do sorriso fácil e quase que inocente, sempre cheia de força apesar de todos os obstáculos. Nossos caminhos se cruzaram de forma meteórica, assim, quase que imperceptível de tão rápido, mas você é uma das coisas que deixarão uma marca em mim enquanto eu existir. 
Hoje faz mais ou menos um mês que você morreu. Mas em momento algum te faltou vida, nem mesmo quando já não era mais possível sequer ficar de pé. E mesmo quando não tinha mais cabelo você nunca deixou de se sentir linda com suas perucas e lenços coloridos. Sempre vaidosa, sempre de batom. Nunca vi de perto alguém tão feliz pelo simples fato de estar vivo como você era. Alguém dar tanto valor a vida e às coisas pequenas, as que realmente importam. Alguém que tinha certeza absoluta que cada dia a mais é um dia a menos e vivia já com um prazo estipulado, mas vivia tão intensamente de forma tão singela. A Amélie Poulain da vida real...
A fila do transplante não ajudava, mas vendo você, mais que nunca, aprendi que  paciência é uma virtude, que não adianta se consumir com aquilo que vai além do nosso alcance quando bem na nossa frente já tem tanta coisa boa e só não enxerga quem não quer. Que é uma escolha ser feliz ou ser triste independente de fatores, pessoas ou condições. Você me fez enxergar que a vida por si só é a maior dádiva que alguém pode ter, e que cada dia vivo é um motivo para ser grato. 
As pessoas esperam o ano virar para colocarem seus planos em prática e ficam esperando que as coisas aconteçam magicamente. As pessoas desistem ao primeiro sinal de dificuldade. As pessoas reclamam da vida quando estão cheias de vida. Nunca estão satisfeitas para enxergar o quanto tem. As pessoas sempre deixam para amanhã aquilo que podem fazer hoje...quando talvez o amanhã possa nem chegar. A vida é curta demais pra adiar seus sonhos. Nosso tempo é curto demais pra perder com lamentações. 
Dizem que a maior dor que uma mãe pode ter é enterrar um filho. E pensar que sua família nunca mais vai conseguir comemorar um natal chega a doer até em mim. Mas sei também que por onde você passou deixou lembranças de amor, assim como por aqui. Como uma estrela cadente; linda, breve, deixando um rastro de luz em seu caminho. Se realmente temos uma missão neste plano, vai ver a sua era espalhar essa mensagem silenciosa de força e perseverança, de amor à vida. Tenho certeza de que agora você vive em algum lugar bem melhor que esse. 
Tua passagem no meu caminho foi uma grande lição de amor e de força, mudou minha vida pra sempre. Você não será esquecida. Se pegar algum sinal de internet aí no céu, espero que essa cartinha chegue até você e te faça um sorrisinho. Daqueles largões de batom carmim. Trezentos beijos. E muita paz. 

segunda-feira, 2 de janeiro de 2017